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Luiza Lian, das trevas à luz do sol

Na coluna de agosto, Jorge LZ fala sobre “7 estrelas | quem arrancou o céu?”, quarto álbum de Luiza Lian

Publicado em 15/08/2023

Atualizado às 18:17 de 28/08/2023

Por Jorge LZ

Após cinco anos do aclamado Azul moderno, Luiza Lian está de volta, em grande estilo, com 7 estrelas | quem arrancou o céu?, seu quarto álbum, o terceiro ao lado do músico e produtor Charles Tixier.

Citada por Jadsa, em seu espetacular Olho de vidro, na faixa “Lian”, como uma força luminosa, Luiza é um dos principais e mais interessantes nomes de sua geração. Artista cuidadosa e irrequieta, destaca-se pela inventividade, pelo requinte sonoro e visual, sem nunca cair no lugar-comum. Seu trabalho tem forte carga imagética e isso fica claro em suas apresentações, nas quais costuma explorar recursos cênicos, como projeções e figurinos que intensifiquem o conceito. No lançamento de Oyá tempo, seu segundo álbum, por exemplo, vestia uma saia de plástico, que além de tomar o palco inteiro ocupava as paredes do teatro, como se Luiza estivesse em uma lagoa, cercada por quedas d’água.

O conceito de 7 estrelas | quem arrancou o céu? vem carregado pelo momento político e social sufocante pelo qual o país passava, antes da pandemia, quando ele foi concebido; além do vazio das redes sociais e do mundo digital, que nos torna, de certa maneira, mortos-vivos. As trevas e o caminho para sairmos delas estão presentes nas dez faixas compostas por Luiza Lian e Charles Tixier.

Foto com fundo escuro mostra mulher jovem vestida de calça cinza escura e casaco roxo. Ela tem os cabelos claros e cacheados, penteados para trás.
Luiza Lian acaba de lançar o disco “7 estrelas | quem arrancou o céu?” (imagem: Larissa Zaidan)

Em Azul moderno, seu terceiro álbum, as águas constituíam o universo mágico por onde Luiza navegava. No disco atual, elas seguem presentes, como na canção “Eu estou aqui”: “por mais fundo que seja o fundo do mar, o mar tem fundo”. Em “Deságua”, aparecem com seu poder de cura: “essa dor é tão velha / quando ela deságua no mar / desaba, deságua e afunda / mas sai de lá lavada pra me abraçar / desaba, deságua e afunda / mas sai de lá lavada pra me abraçar”.

A senha para entrar no universo mágico do álbum está na faixa de abertura, “A minha música”. Luiza dialoga conosco, convidando-nos a “olhar” para sua música, como se ela fosse um espelho e, assim, encontrarmos nossa própria verdade. Do seu ponto de observação, Luiza expõe os excessos de informação e demandas do cotidiano das redes, criando certo desconforto. Porém, as músicas não ficam apenas nas intempéries e descortinam formas para a busca de dias melhores.

Mulher jovem aparece em imagem levemente embaçada, com fundo branco. Ela usa um casaco bege e segura o mesmo na parte dos botões. Seus cabelos são claros, levemente cacheados, um pouco abaixo dos ombros.
Luiza Lian lançou o quarto disco depois de cinco anos do lançamento anterior (imagem: Leon Gurfein)

Esse caminho, que nos leva das trevas à luz, está muito bem pavimentado por uma ambientação sonora, que passeia, ora minimalista ora exuberante, pelo samba, pelo funk, pelo pagodão baiano, pelos ritmos afro-brasileiros, pelo trip hop, pelo pop e pelo indie, em uma construção feita por Charles Tixier a partir de teclados e beats, em sequências harmônicas e experimentações eletrônicas, abrindo diversas possibilidades, tanto para a instrumentação, quanto para a voz de Luiza, que aparece por vezes processada em uma nova identidade. Luiza, com sua voz, e Charles, na instrumentação, dão conta de toda a parte sonora do álbum. A única exceção é a participação especial de Céu, nos vocais da faixa “Tecnicolor”.

A interação da dupla é impressionante e determinante para o resultado coeso de 7 estrelas | quem arrancou o céu?, fazendo dele o álbum mais maduro da carreira da artista paulista. Ainda que o suporte eletrônico seja grandioso e o texto apresente os absurdos do cotidiano, muitas vezes condizentes com um pesadelo, como em “Eu estou aqui” (“Terra plana, carro enguiçado, rio de lama, mar envenenado. Eu estou aqui. Onde é o fim do mundo? Que horas chega o futuro? Qual altura desse muro?”), ao final da audição, o que mais fica impresso é certa organicidade e sensação de leveza.

As questões existenciais que nos chamam a atenção para o caminhar da sociedade, de olhos fechados, rumo a um beco sem saída, aos poucos ganham novos contornos e fazem com que tenhamos vontade de abrir os olhos para a luz do sol, mas deixando claro que essa luz também pode cegar. Nada é fechado em si e, talvez, essa seja a grande lição de 7 estrelas | quem arrancou o céu?: em tempos estranhos, como os que vivemos, como diria Caetano Veloso e Gilberto Gil, “é preciso estar atento e forte”.

 

Coluna escrita por:

 Jorge LZ

Jorge LZ

Carioca, radialista, curador, pesquisador musical, produtor cultural e DJ. Produz e apresenta o programa semanal Na ponta da agulha, na Rádio Graviola, é curador do Festival levada e integra o Radialivres, coletivo de radialistas do Brasil. Foi idealizador e curador do Festival BRio e do projeto Verão musical no Castelinho, e produziu e apresentou os programas Geleia moderna, Radar e Compacto, na Rádio Roquette-Pinto.

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